Entrevista frontal com o rapper açoriano Sandro G
Como te chamas?
Sandro Dinis Raposo Gomes
De onde és natural?
Sou de Ponta Delgada, S. Pedro, da Rua do Passal
Quando nasceste?
A 27 de Março de 1974.
Foste miúdo para os EUA?
Estou lá desde os 3 anos de idade, depois voltei mais a minha família, fui de visita aos 6 mas só me fixei lá aos 9 anos.
Então conheces bem Ponta Delgada…
Sim, tenho cá muitos amigos.
Qual a tua ligação a Rabo de Peixe?
Tenho tios, e dois primos, muito meus amigos, que foram repatriados e estão lá! Mas para o CD teve a ver com o filme “Rabo de Peixe”, um documentário que será lançado nos próximos meses, com realização de Joaquim Pinto. Como meus primos estão lá e eu fiz uma música para eles, a música acabou por ser usada no filme. Uso o nome nas t-shirts para estar aliado ao filme.
As tuas músicas falam um pouco do mau do mundo…
Eu sofri muito. Ir para os EUA aos 9 anos, sítios grandes, muita droga. Em Summerville, para onde fui viver, os meus novos amigos quase todos vendiam droga e estavam cheios de dinheiro. Tinham as melhores bicicletas, e eu também quis. Vendia cocaína, crack, marijuana… Mas só com 18 anos é que comecei a tomar drogas, e foi porque gostei muito de uma rapariga que tomava que acabei experimentando. Foi uma desgraça, viciei-me e acabei sendo preso durante um ano…
Mas tu és americano…
Não, não sou. Mesmo há dois dias, quando estava para vir para S. Miguel, fui às autoridades da Emigração pedir autorização para vir cá. Disseram-me que não podia, que não me autorizavam. Eu insisti, pois estava já tudo organizado e disse mesmo “não me façam isto que me estragam a única oportunidade que tenho na vida”. Fiquei lá até às 17h00 e eles acabaram por me dar um Visa para vir cá. Só que também me deram os documentos para eu escolher a nacionalidade americana, mas eu não quis. Não, eu sou português para o resto da minha vida!
Mas não foste repatriado…
Pois não, porque meti um bom advogado. Aconteceu-me ainda há pouco tempo, com uns problemas antigos, e tive de vender quase tudo o que tinha para pagar o advogado…
Mas sentes-te um pouco americano…
Eu? Nada, nada! Vê-me estas tatuagens… Achas que eu me sinto americano?
Mas conseguirias viver nos Açores?
Sinceramente, acho muito difícil. Os Açores precisam de muita ajuda… Eu não quero ficar nos EUA para sempre. Talvez mais uns 10 anos só, mas depois quero viver cá. Meu pai tem duas casas, vai vender uma, vai-me dar o dinheiro e com o resto que tenho no banco vou fazer uma casa linda em Rabo de Peixe…
Em Rabo de Peixe?
Sim, eu adoro o mar, aquele cheiro, aquelas pessoas… Sem Rabo de Peixe eu não seria o que sou agora. As crianças de lá foram as primeiras a ter o CD…
Como chegou cá a tua música?
Em Julho de 2002 mandei um CD para o meu primo Tony. Ele deu a um amigo, começaram a fazer cópias e elas estão por todo o lado. Eu sei que falo mal na minha música, mas não tenho vergonha… No rap americano eles dizem para matar, que roubam as mulheres dos outros… Eu não, não apelo à violência, eu só falo de mim, falo dos fumos…
Ainda tomas drogas?
Muito pouco, só numa festa ou outra. Cá só fumei dois charros de xamon…
Como saíste das drogas?
Eu via a minha mãe muito consumida, não dormia à noite, estava em liberdade condicional, e percebi que tinha de mudar a minha vida. Decidi começar a trabalhar – com 22 anos foi o meu primeiro emprego a sério. Comecei na pintura e na construção civil, mas depois fui trabalhar nos caminhos, no breu – trabalha-se 8 meses e descansa-se 4, dá bom dinheiro. Fiz isso 5 anos…
Como aparece a música na tua vida?
É sempre a dar. Não toco nada mas gosto de cantar. Quando cheguei à América comecei a imitar os rappers para aprender o inglês –LL Cool J, Run DMC, etc –, foi a minha maneira de aprender inglês…
Nunca foste à escola, como referes numa música?
Nunca fui bom na escola, porque não atinava com a língua. Eu fugia e até fui fechado pelo Tribunal por isso. Mas não dava. Foram os rappers que me ensinaram a falar.
E músicas originais?
Um dia decidi que ia ser o primeiro açoriano a fazer rap. Nos EUA sou o primeiro português a fazê-lo. Sei que não sou o primeiro em Portugal, mas é assim.
Há diferença do rap português para o teu rap?
É diferente. O meu é mais das ilhas. Qualquer açoriano que ouça as minhas músicas vai senti-las no coração, vai gostar. Mesmo cá, até os mais pequenos já conhecem as músicas…
Pretendem conquistar o mercado português?
Sim, sim. Já há muitos contactos, mas as empresas portuguesas querem ficar com tudo e dar-me muito pouco. Prefiro ser pobre do que ser roubado, ninguém vai tirar o meu trabalho e fazer pouco. A Sony e outras estão a negociar, mas o preço vai ter de ser o certo. Não estou a fazer isto para ser famoso ou um actor. Quero ser uma pessoa normal…
Porque é que fazes isto?
A gente precisa disto. Cá estão a ouvir música dos outros, quando podem ouvir a sua própria língua…
Pensas entrar no mercado americano?
É muito difícil. O que queria era fazer a minha música só em Portugal e nos Açores. Mais tarde vou abrir uma companhia de roupas – já tenho duas estilistas a trabalhar nisso; a marca vai ser “DROGO”, (DRO de Sandro e GO de Gomes)…
Estás a gostar de estar cá?
Estou a adorar. O meu manager mesmo diz: ele, que já conhece muitos países, diz que nunca viu um sítio tão bonito e com pessoas tão meigas…
E problemas?
Já vi alguns. A bebida é um problema grande. E a gente sabe o que a bebida dá. Fui criado numa família de bêbados, sei o que isso é e por isso não bebo!
Como é que viste cá?
Fui convidado pela RTP. Fui primeiro convidado para o HermanSic, mas decidi vir cá primeiro, pois é a minha terra. Agora que já vim, estou pronto para ir a Lisboa.
Há já segundo CD na forja?
Sim, mas tem uma surpresa: não dá para fazer cópias… é protegido. Com o primeiro CD não ganhei dinheiro nenhum. Olha, eu até já autografei CDs pirata… Mas está bem, música é música. Até conheci rapazes que me disseram que ganharam algum dinheiro a vender cópias piratas, que lhes deu muito dinheiro. Não me importo, foi o primeiro… Talvez o nome seja Açores ou Portugal, com muitas fotos de S. Miguel.
Já tens músicas?
Sim, já tenho 5 prontas…
A Indecent Music é uma empresa de discos?
Sim, e já temos mais artistas. Digo já que se vir algum miúdo cá a tocar bem rap, eu levo-o e gravo lá…
E o Brasil?
Só depois de Portugal e dos Açores…
Já há concertos marcados?
Ainda não há nada assinado, mas há uma série de contratos em quase todas as ilhas. S. Miguel quase de certeza estou cá em Julho para tocar. Daqui a 3 semanas volto para estar uns dias com a minha avó, que vive ainda na rua do Passal e devo vir às festas do Santo Cristo…
Qual é a mensagem que tens para os miúdos de cá?
O que eu digo é que as crianças fiquem nas escolas e aprendam bastante, é muito importante. Olha para mim: eu sinto falta de escola. Um dia gostava de estudar a sério. Tenho 29 anos e nem sei tocar num computador. É a minha vida, mas…
Sentes-te um bocado animal?
É, é isso. Nunca gostei de jogos, e nunca atinei com os estudos…Nunca aprendi, nunca quis aprender, não tenho gosto. Sou um daqueles açorianos velhos, como o meu avô, velho…
Cantas para os miúdos não serem como o Sando G?
Canto para os miúdos verem: não façam o que eu fiz!
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